A maquilhagem na Idade Média
- InfoBlog de JD
- 6 de jul. de 2019
- 3 min de leitura
Atualizado: 12 de out. de 2021
Um artigo original de 'Repensando a Idade Média',
Sombra aqui, sombra ali: a maquilhagem na Idade Média.
A maquilhagem e o adorno sempre foram um elemento fundamental tanto para mulheres como para homens desde que a humanidade é...bem, humanidade. O medievo não foi uma excepção, tanto que é nesse período que começamos a ver a tendência (especialmente no ocidente Cristão) de relacionar estes assuntos de beleza e bem-estar directamente com as mulheres, e além disso, vemo-lo converter-se num assunto amplamente criticável.

Para falar de maquilhagem primeiro temos que falar do ideal de beleza que imperava na Europa medieval, na qual está presente de forma muito clara na literatura com temática do amor cortês. Abandona-se assim o aspecto mais "carregado" das suas antecessoras romanas em favor de um look directamente relacionado com a imagem da mulher perfeita: a Virgem. A mulher ideal tinha assim que apresentar a pele pálida, cabelos louros (preferencialmente liso ou pouco ondulado), as bochechas e os lábios vermelhos e as pestanas pretas. Uma imagem modesta mas, como veremos, não tão fácil de conseguir.
A doutrina Cristã teve uma visão muito negativa quer da maquilhagem, quer de qualquer adorno pessoal (como penteados ou jóias), em primeiro lugar como ruptura com a estética romana anterior, e segundo, como defesa da modéstia tanto feminina como masculina. O corpo havia sido criado perfeito à imagem e semelhança de Deus, de modo que não seria necessário modificá-lo nem adicionar-lhe nada de supérfluo. A maquilhagem teve também uma relação directa com vários pecados, não só a soberba mas também a luxúria pois entendia-se que as mulheres se maquilhavam exclusivamente para atrair homens, um comportamento típico das prostitutas, e revelando uma personalidade falsa pois apresentavam a sua imagem pessoal adulterada da realidade. E que negava igualmente a ideia de que o corpo humano era algo perecível e o que realmente importava era a procura da vida eterna de cada uma das almas. Um "Mens pura in corpore martire" (mente pura em corpo mártir) em contraste com o "Mens sana em corpore sanum" (mente sã em corpo são) da Antiguidade Clássica.

No entanto, durante a Idade Média nem tudo o que parece foi realmente, e neste assunto, a documentação apresenta-nos provas da relativa flexibilidade da censura social dependendo das situações. Em momentos determinados não era visto com maus olhos o uso de maquilhagem e de jóias, especialmente se a moça o fizesse com o intuito de atrair um homem para o desposar e desde que apenas esse sujeito em concreto. Também a malha era mais permissiva quando se tratavam de preparativos para celebrações como um casamento ou uma justa.
Mas dissesse a Igreja o que dissesse, a maquilhagem continuou a espalhar-se como uma moda: perfumes e azeites eram vendidos amiúdes vezes a todas as classes sociais. As mulheres recorriam em várias ocasiões a métodos para branquear a pele que eliminavam também imperfeições da face, a mais comum sendo rugas, com sumos de morangos e framboesa ou massajar o rosto com um cristal de amatista húmido. Receitas de cosmética do século XII falam em misturas de raízes de lírio com farinha de trigo, que após repousar durante 15 dias formava um pó que se aplicava da mesma forma com que se aplica a base de hoje em dia. Em finais do medievo passaram a usar-se outros produtos mais eficazes, mas também mais perigosos, como o arsénico.

Para os lábios e bochechas utilizava-se pó vermelho extraído do vinho, mesclado com cera de abelha. As tintas para o cabelo de origem vegetal costumavam deixar uma tonalidade também avermelhada e temos notícias do uso de pintura negra para realçar as pestanas e o contorno dos olhos, como um "eyeliner", de resto muito criticada em textos religiosos.

Mas não eram apenas as mulheres que tentavam melhorar a sua aparência, apesar de que a sombra do pecado apenas se aplicasse a elas (dentro do espírito misógino de alguns), a maquilhagem masculina tinha o objectivo de manter uma imagem de juventude e virilidade, especialmente recorrendo a métodos de prevenção e remédio para a calvície, fenómeno tão temido entre os homens.

O mais curioso era que o podia ser usado para melhorar o aspecto também podia ser o usado para o seu contrário, pois a cosmética pode fazer alguém parecer doente de uma enfermidade que não tenha e conseguir assim permissão para mendigar e causar maior piedade às almas generosas. A doença favorita escolhida pelos maquilhadores era invariavelmente a lepra, um flagelo de grande impacto social, pois se pensava que era extremamente contagiosa pelo contacto com infectados.
Artigo traduzido da página original do "Renovatium Medievalium", cujo link é disponibilizado aqui.
- Pedro Alves.
INFORMAÇÃO ADICIONAL:
FONTES BIBLIOGRÁFICAS:
Montoya Ramírez, María Isabel (2014): Los afeites femeninos en la Edad Media española: estudio léxico.
Powder and Paint: Make-Up and the Medieval Woman by Catherine Hokin.
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